Tacape:
Já vi muita gente reclamar por suas declarações terem sido “distorcidas” ou “tiradas do contexto”. Nesse caso, foi muito pior. Algum gênio na “Veja” teve a idéia de ler (?) um artigo do antropólogo e “resumir” numa frase o pensamento dele. Só que a revista deu a entender que se tratava de uma declaração de Viveiros de Castro. E o mais grave: a frase entre aspas não tinha nada a ver com o pensamento do antropólogo.
A “Veja” joga fora, assim, a sua história – como já fez em dezenas de outros episódios. Aquela publicação, dirigida por Mino Carta e que (apesar de todas as limitações e cautelas) enfrentou a ditadura e denunciou até tortura nos anos 70, talvez fosse ilusão. Talvez, nunca tenha existido. Como o soldado do filme. E como a entrevista do antropólogo. “A Entrevista que Nunca Existiu” gerou uma reação irada na internet. Viveiros de Castro explicou que – de fato – tinha sido procurado pela equipe de “Veja”, mas não quis dar entrevista:
“Recusei-me a falar com eles, é meu direito, por não confiar na revista, achá-la de péssima qualidade jornalística, e por abrigar um batalhão de colunistas da direita hidrófoba. Parece que foi em vão, já que isso não os impediu de falarem comigo”.
Essa declaração de Viveiros de Castro existiu! Foi dada ao blog “Escrevinhador”, mantido na internet por esse novo colunista de Caros Amigos. Dezenas de outros blogueiros e twitteiros também reagiram à arrogância de “Veja” – que agora se dá ao direito de entrevistar, na marra, até quem não foi (e não quer ser) entrevistado.
Entre os twitteiros que reagiram à “Veja”está o jornalista Felipe Milanez. Ele trabalhava na revista “National Geographic Brasil”, também editada pela Abril. Trabalhava, eu disse. Milanez (especializado em reportagens sobre nações indígenas) escreveu em seu twitter a seguinte nota: Eduardo Viveiros de Castro achou um bom adjetivo pra definir a matéria da Veja, “repugnante”.
Pouco tempo depois, Milanez virou vaga – como a gente diz nas redações. Minha solidariedade a ele! Sei o que é isso, passei por algo parecido na TV Globo, em 2006… A Abril usou a guilhotina patronal contra a opinião de um funcionário. Os donos da imprensa esquecem que, ao pagar o salário dos jornalistas, estão pagando apenas pela força de trabalho. Não são donos de suas opiniões. Ou são?
Sobre isso, o Luiz Carlos Azenha (veterano de muitas redações e blogueiro do ótimo “VioMundo”) costumava dizer, quando éramos colegas na Globo: “eles esquecem que compram apenas meus serviços. Se quiserem comprar meu cérebro, vão ter que pagar muito mais”.
Cada vez que essa gente usa a guilhotina patronal, e corta a cabeça de um jornalista, faz com que dezenas de outros botem o tacape na cintura, e partam para o contra-ataque. Nessa coluna, posso prometer, manterei o meu afiado.
Rodrigo Vianna é jornalista