Governo tira R$ 7,4 bi da saúde e da educação

Republico materia do jornal Correio Brasiliense, 16/02

Depois de muito suspense e de várias divergências dentro da equipe econômica, o governo anunciou ontem um corte de R$ 55 bilhões no Orçamento deste ano. Nem mesmo as áreas de saúde e educação, consideradas vitais pela presidente Dilma Rousseff, escaparam da tesoura. Os dois setores perderam R$ 7,4 bilhões em relação ao que foi aprovado no Congresso Nacional. O Palácio tentou minimizar o impacto da medida com o discurso de que os ministérios comandados por Alexandre Padilha e Aloizio Mercadante, ambos petistas, tiveram as verbas preservadas em relação à proposta orçamentária encaminhada ao Legislativo no fim de agosto de 2011. O argumento não convenceu.
No Palácio, assessores de Dilma disseram que os cortes anunciados pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, contemplaram todos os interesses. Inicialmente, discutia-se um arrocho entre R$ 60 bilhões e R$ 70 bilhões, cifra defendida pelo Banco Central, como forma de a instituição manter os juros em baixa sem pressionar a inflação.

De outro lado, a Casa Civil e o Planejamento apoiavam um bloqueio orçamentário menor, entre R$ 45 bilhões e R$ 50 bilhões, para garantir os investimentos públicos e um maior crescimento da economia. A presidente preferiu acatar a sugestão de Mantega e evitar os extremos.

O corte previsto para este ano é 10% maior que o de R$ 50 bilhões anunciado em 2011.

Mantega explicou que o objetivo do contingenciamento é, em meio à crise vivida na Europa e às incertezas que rondam o mundo, dar continuidade ao crescimento econômico brasileiro e atingir a meta de superavit primário (economia para o pagamento de juros da dívida) de R$ 139,8 bilhões ou 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). Para alcançar esse resultado, o governo aposta em um avanço da atividade de 4,5% este ano, bem acima dos 3% estimados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), com inflação de 4,7%.

Gritaria
Na comparação entre os ministérios, além da Saúde e da Educação, o das Cidades, alvo de fortes denúncias de corrupção, foi um dos mais prejudicados, com perdas de R$ 3,3 bilhões em verbas. Depois dele, destacam-se as pastas da Defesa, com redução de R$ 3,3 bilhões; da Justiça, com menos R$ 2,2 bilhões; e da Integração Nacional, esvaziada em R$ 2,1 bilhões. Por meio de sua assessoria de imprensa, o ministro da Defesa, Celso Amorim, contestou os dados do Planejamento. Argumentou que o corte não será de R$ 3,3 bilhões, mas, sim, de R$ 2,7 bilhões, pois o que foi limado se refere a emendas parlamentares. O ministro ressaltou ainda que foram mantidos projetos estratégicos, como o monitoramento de fronteiras e o controle do espaço aéreo.

Entre as despesas discricionárias, que são consideradas não obrigatórias e incluem os investimentos, a redução na peça orçamentária foi de R$ 35 bilhões – foram R$ 15 bilhões, além dos R$ 20,3 bilhões em emendas de políticos, decisão que, por sinal causou uma gritaria geral no Congresso contra o governo (veja mais na página 12).

Outros R$ 20,5 bilhões foram reduzidos das despesas obrigatórias, fruto, principalmente, da mudança de parâmetros econômicos. Por exemplo, o Orçamento previa um salário mínimo de R$ 623, mas o valor foi cravado em R$ 622. Além disso, houve redução de R$ 7,7 bilhões na previsão de gastos com benefícios previdênciários. De acordo com Miriam Belchior, a projeção de crescimento vegetativo dessa despesa foi reduzida de 3,2% para 3,1%.

Com todas essas mudanças, grosso modo, o governo passou a perna no Congresso Nacional e fez o Orçamento retornar à proposta original encaminhada no ano passado. Reforçou ainda o discurso dos especialistas de que a peça orçamentária é uma obra de ficção.

Ceticismo
Alheio às críticas, o ministro da Fazenda destacou que o arrocho no Orçamento brasileiro é diferente do ajuste fiscal realizado nos países europeus, com corte de investimentos, de programas sociais e de empregos. “Estamos fazendo uma consolidação fiscal que vai levar a um resultado primário satisfatório e viabilizar investimentos. Não é um reajuste clássico, conservador”, disse.

O ministro também deixou claro que o corte de R$ 55 bilhões é um empurrãozinho no trabalho do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, de dar sequência à redução da taxa básica de juros (Selic), hoje em 10,50% ao ano, e, com isso, estimular projetos de investimentos da iniciativa privada. Não à toa, Mantega está apostando em um incremento de 10,8% nos desembolsos produtivos ao deste ano na comparação com 2011.

A meta do governo é que a taxa de investimento em relação ao PIB fique em 20,8%, acima dos 19,6% registrados no ano passado. Desse total, a fatia do setor público é algo em torno de 3%. O restante caberá à iniciativa privada. “Vamos chegar a uma taxa de investimentos de 24% do PIB em 2014”, estimou. Nas contas do mercado, se esse indicador não avançar na velocidade estimada pela Fazenda, dificilmente o país conseguirá crescer acima de 5% ao ano sem pressionar a inflação.

Tanto Mantega quanto Miriam Belchior asseguraram que os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de mais de R$ 40 bilhões, serão 20% maiores do que os de 2011. “É ambicioso, mas é possível. Se olharmos para os anos anteriores, o crescimento acompanhou esse ritmo. Hoje, temos mais projetos e mais experiência. O Estado está mais aparelhado para realizar as obras neste ano. É uma meta exequível e vamos trabalhar para que ela seja cumprida”, afirmou o ministro.

Mantega ainda prevê um crescimento de 10% nas receitas administrativas na comparação com o ano passado para R$ 700 bilhões, ou seja, R$ 24,5 bilhões a menos do que os previsto inicialmente no Orçamento aprovado em dezembro. Essa previsão de aumento na receita é vista como positiva pelo economista Frederico Turolla, diretor da consultoria Pezco. “O fato de o corte ter sido maior do que o do ano passado é uma sinalização positiva de compromisso com a manutenção da política fiscal neste ano”, comentou.

Já o economista sênior da Economist Intelligence Unit, Robert Wood, duvidou se o contingenciamento será suficiente para o governo alcançar a meta cheia de superavit primário (sem descontos de gastos do Programa de Aceleração do Crescimento) de 3,1% do PIB. Ele também questionou a estimativa da de avanço de 4,5% do PIB. “Nossa projeção de crescimento para o Brasil é de 3,3%, diante do quadro pessimista para a economia global”, afirmou.

Áreas ambiental e tecnológica perdem
O contingenciamento anunciado ontem pelo governo afetou também os ministérios do Meio Ambiente (MMA) e de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Os órgãos perderam, respectivamente, 19,4% e 22,1% dos montantes previstos na lei aprovada pelo Congresso Nacional. O primeiro sofreu uma redução de R$ 197 milhões do total de R$ 1,01 bilhão previsto na peça orçamentária. Já o MCTI viu seus recursos caírem de R$ 6,71 bilhões para R$ 5,23 bilhões, uma diferença de R$ 1,48 bilhão.

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